quarta-feira, 15 de julho de 2009

Vitória X Santos (peixe de chocolate)

Levei de novo meu sobrinho torcedor do Bahia. Como já disse, faço isso pelo menino, pra ele ver um jogo de primeira, com jogadores de primeira, com times de primeira... Além de tudo, ele foi pé quente contra o Grêmio.

Como já disse também, ele joga no infantil do Bahia e viu o time do Santos por lá no Fazendão, treinando pro confronto com o Vitória.
“Mancini fez um golaço”, disse ele, comentando sobre um coletivo em que o treinador (ex) do Santos participou.

Também levei Cezar, um amigo que não ia ao Barradão desde 2004.
– Você não é pé frio, não, né?
– Tá maluco... – respondeu ele.

Chegamos cedo e pela primeira vez na história dessa porra eu não peguei fila pra entrar pela portaria do “Sou mais Vitória”.

O jogo começou.
– O jogo vai ser duro – disse um senhor do meu lado – Mancini conhece o Vitória.É um a zero Vitória – completou.

E em três minutos esse um a zero apareceu. Vacilo clássico de goleiro X astúcia clássica de atacante. Foi dar um chutão, furou, atacante atento, gol.Um a zero. Torcida comemorando e meu sobrinho disse:
– O Santos vai virar.
– Quem vai virar é você, que vai virar Vitória – respondi.

Um gol dessa forma, no início do jogo, além de mexer com o emocional de um time, desmonta todo o seu esquema tático. E isso ficou evidente. O Peixe ficou sem ar, balançando pra lá e pra cá, até que aos 15 minutos Leandro Domingues fez um lançamento primoroso para Roger, o autor do primeiro gol, que chutou para uma boa defesa de Douglas, o goleiro do Santos, o redimindo da merda que fez no lance do primeiro gol. Porém, ele deu rebote e a bola voltou pra Roger, que se redimiu da merda que fez no primeiro chute. Dois a zero.

– Assim vai ser mole – disse o senhor do meu lado, que antes tinha dito que ia ser duro. O que ele não imaginava, nem ninguém ali, é que seria tão mole.

Aos 24 minutos, outro contra ataque fulminante e terceiro gol do Vitória. Três a zero. Aos 28, quatro a zero com um gol Victor Ramos, zagueiro da divisão de base.
– Acabou o jogo. Acho até que vou sair do estádio. Lá fora posso tomar uma cerveja e ver o resto do jogo pelo rádio – brincou Cezar.

O Santos tremia em campo. Tentou sem perigo por algumas vezes, mas nada acontecia. O Vitória, naturalmente, diminuiu o ritmo depois do chocolate que dava. O Santos continuou tentando e conseguiu um pênalti no último lance. Quatro a um. Logo depois da cobrança do pênalti o juiz apitou o fim do primeiro tempo. Os aplausos da torcida do Santos pro golzinho nem foram ouvidos, pois foram abafados pelos aplausos da torcida do Vitória, que aplaudia o time que saia de campo.
– O Santos vai virar – disse meu sobrinho.

Segundo tempo começou e como era de se esperar, o Santos veio pra cima. O gol no final do tempo anterior deu um ânimo extra aos jogadores, que numa falta cobrada ao 16 minutos, chegou ao segundo gol. Quatro a dois.
– O Santos vai virar – disse meu sobrinho.

A torcida do Vitória não se abalou muito, mas o time, um pouco, e num rápido contra ataque, a bola chegou na cabeça de Kleber Pereira. Graças a uma defesa milagrosa de Viáfara, o Santos não fez quatro a três. A torcida então sentiu o baque.
– O time relaxou – gritou um torcedor.
– O Santos vai virar – disse meu sobrinho.

O Vitória passou a errar passes no meio de campo e o Santos passou a gostar do jogo.
O clima ficou tenso. Um quatro a três seria emoção demais.
– Tomara que essa porra acabe logo – disse Cezar.

Mas o Vitória tem uma coisa que nenhum time tem. Apodi. Com Apodi, as chances do Vitória estar no campo de ataque são maiores. O time recuperou o fôlego, recuperou o meio campo e voltou a atacar. Criou boas chances e conseguiu um pênalti onde Leandro Domingues, que deu o passe para três dos quatro gols, converteu. Cinco a dois. Nem meu sobrinho falou mais nada. O chocolate já estava escancarado. Cinco minutos depois, Jackson, que acabara de entrar, fez o dele depois de quatro meses parado. Primeiro ele perdeu um gol de cara, chutando pra fora, mas logo depois, ele começou uma jogada tocando pra Roger e correndo pra receber em velocidade, cabeceando de forma fulminante. Seis a dois.

Veja aqui o vídeo do jogo. Não consegui filmar todos os gols (foram muitos), mas tem boas cenas.

Ironia do destino: Mancini pediu demissão do Vitória, mas no primeiro confronto depois disso, o Vitória foi lá e “demitiu” Mancini. Ele achou que conhecia o Vitória, mas na verdade era o Vitória que o conhecia.

Cezar disse:
– Rapaz, quando o juiz apitar, dê um zoom pra filmar Mancini de perto que você vai ver um cara se aproximando dele com a rescisão e uma caneta.

Depois disso o Santos ficou entregue e o Vitória perdeu gols sucessivos. Poderia ter sido nove ou dez a dois. Apodi infernizou o ataque do time que o desprezou no ano passado. Não tem como ele não correr, é só ele pegar na bola que vinte mil pessoas começam a gritar “vai, Apodi, vai, Apodi, vai, maluco, vai, Apodi...”. E ele vai.
Apodi é ídolo. Devia ter uma estátua dele no Barradão. Só assim pra ver ele parado.

Os torcedores do Bahia torcem contra Apodi, fazem piadas sobre ele, tentam denegrir, invejosamente, o nosso velocista... Mas a gente entende. Os caras estão acabados.
De vez em quando eu leio blogs alheios de torcedores do Bahia (assim como leio blogs de torcedores do Flamengo, do Corinthians, do Internacional...) e os textos dos torcedores do Bahia são o reflexo da nostalgia. Os temas são sempre “ah, como era bom aquele tempo, 30 anos atrás...”, ou de revolta por goleadas sofridas contra Américas da PQP, Ipatingas e Figueirenses.

E Paulo Carneiro vestindo a camisa do Bahia foi a coisa mais estapafúrdia do ano. O termo “vestir a camisa da empresa” pode se empregar em qualquer ocasião, menos em um time de futebol, onde a camisa é o que veste, sobretudo, o torcedor. Mudar de time quando criança, tudo bem, é normal, é aceitável, o indivíduo está começando a entender as coisas, vendo quem ganha, quem perde e assim passa a gostar de um time ou de outro. Conheço tricolores filhos de rubro-negros e vice-versa. Mas virar a folha depois de velho é lamentável. A torcida do Bahia ainda aceita esse tipo de coisa.
Quando ele foi anunciado, eles repudiaram:
– Um rubro-negro no meu Baêa?! Nem com a porra – diziam os tricolores.
Aí ele deu uma entrevista cheia de pompa, usando uma linguagem moderna de marketing, falando em números, falando do seu passado...
– O cara é um bom administrador, hoje o futebol moderno precisa disso... – mudaram o discurso.
Chega a ser decepcionante ver em como acreditam em tudo. É como lotar a Fonte Nova pra recepcionar Viola em 2005, com 37 anos de idade. Cinqüenta mil foram ver Kaká no Real Madri; mais que isso foi ver Viola. Muitos tricolores ainda se vangloriam desses números.
De qualquer forma, já que Paulo Carneiro fez isso de vestir a camisa, ou ele devia ter feito um regime ou ter pedido à empresa que confecciona aquele pano uma XXG.

Enquanto isso, muitas crianças no Barradão comemoravam, felizes, rindo contentes por causa do seu time. Deve ser por isso que meus amigos torcedores do Bahia andam tão nervosos. Os torcedores mirins do seu time estão sumindo. Sem crianças nos estádios não existe felicidade. Elas estão querendo ir ver o jogo do Vitória.

2 comentários:

marco disse...

rapaz, gostei da escrita e de seu broder cezar, o pe quente. até o final do primeiro turno seu sobrinho vira vitoria e desiste de sofrer, e não sonhar (o que é pior).
afinal, o bahia é como o uruguai, um time de tradição, camisa, paixão, grande campeao da copa de 30, e 50...pqp. Uma grande ex-equipe em atividade.

Anônimo disse...

Lindas as cenas da menininha rubro negra vibrando com seu clube do coração. Time do presente e do futuro, sem deixar de ser um dos mais tradicionais do País. Parabéns pelo texto também, como sempre.